sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Cresce número de brasileiros na L.E

O número de brasileiros que se alistam na Legião Estrangeira, corpo do exército francês formado apenas por estrangeiros, tem aumentado nos últimos anos. São, na maioria, ex-militares descontentes com as condições das Forças Armadas no Brasil. 


Segundo dados do próprio exército francês, em 2005 havia cerca de 155 brasileiros na Legião, formando 2% do total de 7.699 soldados. Em 2007, o número subiu para cerca de 230 – um aumento de 50%.
A Legião Estrangeira é considerada como um corpo de elite do exército francês. É conhecida pela sua ação de guerra rápida e eficaz.
"É uma tropa formada por jovens estrangeiros, que na maioria passaram por dificuldades em seus países. Nesse sentido, são soldados mais 'durões'", disse à BBC Brasil o tenente-coronel Christian Rascle, responsável pelo setor de comunicação.
"Além disso, oficialmente, todos são solteiros e, portanto, é uma unidade que pode ser deslocada mais rapidamente para missões operacionais. E claro, o fato de serem soldados estrangeiros profissionais também é interessante para a França do ponto de vista político", afirmou o tenente-coronel. 

Candidatos
Qualquer homem estrangeiro pode se alistar, desde que tenha entre entre 17 a 40 anos e um documento de identidade válido. Não é preciso nem mesmo falar francês, e o alistamento é feito em 11 escritórios em toda a França.
A cada ano, cerca de 7 mil candidatos de 150 países diferentes se alistam. Depois da pesada bateria de testes, apenas mil são aceitos.
O Brasil é o país latino-americano com mais recrutas. Somente em 2007, cerca de 50 brasileiros foram aceitos - um em cada 20 novos recrutas. A grande maioria vem das regiões Norte e Nordeste do país.
"Os brasileiros são geralmente considerados bons recrutas porque na maior parte são corajosos, além de serem muito motivados", disse Rascle. Segundo ele, o número de brasileiros que se torna sub-oficiciais cresceu, o que demonstra um sinal de confiança da Legião com relação à comunidade.
Os legionários brasileiros são, na maioria, jovens entre 23 e 36 anos que prestaram o serviço militar obrigatório ou que deixaram as Forças Armadas para tentar uma carreira militar no exterior.
A Legião Estrangeira não divulga números exatos porque em alguns países é proibido o alistamento de cidadãos nacionais no exterior. Segundo o Ministério da Defesa, este não é o caso do Brasil. 

Motivação
Um dos fatores que colaboraram para o aumento da procura de brasileiros foi o a avanço da internet no país.
O site oficial da Legião Estrangeira traz explicações detalhadas sobre o alistamento em 14 línguas, inclusive em português. E no Orkut, rede de relacionamento pela internet, já são mais de 20 as comunidades onde aspirantes e ex-legionários podem trocar informações. A maior delas tem mais de 2,5 mil membros. O mediador, Luiz Camões, diz receber em média dez e-mails por semana.
"Os maiores incentivos para esses jovens são a aventura, o salário superior ao do exército brasileiro, a idéia de que vão poder combater e a possibilidade de virar um cidadão francês ou receber visto permanente", disse Camões à BBC Brasil.
Depois de 3 anos de serviço, os legionários têm direito a residência na França e à nacionalidade francesa. Outro grande incentivo é o salário: o vencimento inicial é de cerca de 1 mil euros (R$ 2,7 mil), podendo chegar a mais de R$ 3,7 mil no primeiro ano. No Brasil, o soldo de um recruta é R$ 207 e o de soldado, marinheiro ou fuzileiro naval pode chegar a R$ 741.
Mas a maior motivação para os ex-militares brasileiros é a falta de perspectiva na carreira militar dentro do país. Eduardo Vidali, de 27 anos, diz que decidiu fazer a prova da Legião Estrangeira depois de ser "botado na rua" pelo Exército brasileiro.
"Fui voluntário. Sempre gostei das Forças Armadas. Queria usar o uniforme verde-oliva do meu país", disse Vidali à BBC Brasil.
Depois de prestar o serviço militar obrigatório em Jundiaí, Vidali foi contratado como militar temporário e passou a trabalhar para o Exército. Chegou a ser promovido a cabo, mas depois de 7 anos, de acordo com a lei, seu contrato não podia mais ser renovado. "Depois de tudo isso foi simplesmente 'adeus, até mais'".
Já o carioca Marcelo, de 36 anos, oficial do 2º Regimento de Pára-Quedistas da Legião Estrangeira, conta que sentiu sua carreira ser prejudicada porque a gratificação adicional de pára-quedistas foi cortada.
"Além disso, acabaram os cursos de comandos, de salto livre, então não me senti motivado a continuar lá. O salário era muito baixo, eu sabia que ia ganhar bem mais estando do lado de fora."
Marcelo
Marcelo diz que preferia usar a bandeira brasileira no braço
No exército francês há 3 anos, Marcelo conta que outro grande atrativo é a estrutura, muito superior na Legião. "No Brasil faltam recursos financeiros, bons equipamentos", afirmou à BBC Brasil.
Ele diz que gostaria de estar servindo o seu próprio país. "Eu prefiria estar com a bandeira do Brasil aqui no braço, mas infelizmente quem me deu a oportunidade de continuar a minha carreira, de fazer o que eu gosto, foi a França. Minha missão agora é lutar pelo Exército francês. Se o Brasil me chamasse eu voltava, largava a Legião. Mas infelizmente isso não vai acontecer", disse. 

Ex-legionário
Já o sargento-chefe Fausto Camilo da Silva, de 40 anos, recém-aposentado da Legião, disse à BBC Brasil que se sente "um pouco francês" depois 18 anos de serviço. Apesar de sempre ter sonhado em ser miltar brasileiro, ele abandonou a carreira por causa do baixo salário.
Durante todos esses anos, Fausto participou de algumas das missões mais importantes das Forças Armadas da França. Ele integrou a equipe responsável pelo resgate de cidadãos franceses no Chade e em Ruanda em 1990, durante o conflito entre Tutsis e e Hutus; apoiou a ocupação americana à Somália em 1993; e no Kosovo fez parte de uma missão de manutenção de paz sob a bandeira da Otan em 2001. 
Outra missão que ficou na memória foi a da Somália, quando as forças francesas foram chamadas a apoiar a ocupação americana de 1993.
"A nossa missão era controlar o norte do país. O trabalho era fazer patrulhas pra ver se encontrávamos rebeldes, e daí desarmá-los. Fomos atacados uma vez, mas sem perda de vidas. O mais complicado era o clima, muito quente. Montamos um quartel no meio do deserto, de onde fazíamos as missões."
Assim que se aposentou, no ano passado, ele voltou para São Paulo. Além da cidadania francesa, trouxe na mala uma aposentadoria de 900 euros mensais, cerca de R$ 2,5 mil reais.
Recém instalado, já está em busca de trabalho em uma área muito popular entre ex-legionários do mundo todo: segurança Vip. "Tenho experiência nessa área e um bom treinamento. Estou fazendo testes para uma empresa inglesa", conta.

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